Tenho
pensamentos recorrentes que, por vezes, vêm numa avalanche que
faz com que toda a minha atenção fique subjugada dentro das
emoções retidas de cada memória. Ora, eu tenho muitas memórias na
minha memória...
Depois
de muito ter lido a respeito, nestes últimos meses, encontrei o nome que se dá a isto:
viver dominada pelo ego.
Andei anos convencida
de que o ego era uma forma de superioridade e de arrogância mas, pelo
que parece, pode disfarçar-se de muitas maneiras e tornar-se o
inquilino enraizado de formas-pensamento, estados emocionais ou
mentais, que vai chutando, nos tais pensamentos recorrentes, o
desagrado e a infelicidade que nos torna tão vulneráveis e prostrados, ao invés do causador deste mal-estar, próspero e gordo de satisfação.
Segundo
Eckhart Tolle “o ego surge quando a sua noção de Ser, de “Eu
Sou”, que é consciência sem forma, se confunde com a forma.”
O
ego adora a forma deformada das coisas e faz finca-pé quanto à estratégia de ir debitando, naquela corrente incessante e cansativa que atravessa a
mente, tudo o que quer que acreditemos que é feio ou desajustado
para/em nós: o mundo, os outros, a vida.
Quando
me deparei com este alerta percebi que o trabalho aplicado, com o objectivo de enfraquecer o sr. Ego, está ainda longe da sua acção definitiva. Não posso dizer que tenha feito um mau trabalho, mas sem a
devida instrução sobre como se desliga a ficha, é o mesmo que
desconhecer o que eu sou na minha forma egóica.
Já
passei por algumas situações-limite, em que perdi muito, quase
tudo, grandes abanões e quedas, mas não cheguei a experienciar a
Paz ou a Voz que muitas pessoas referem como a origem da reviravolta
total nas suas vidas.
Antes
pelo contrário. Esses momentos trouxeram-me angústia e medo, e isso
pode querer dizer que, depois de uma determinada noção de
identidade me ter sido retirada pelas circunstâncias da vida, o sr.
Ego não ficou arruinado como devia. O que foi que ele fez?
Identificou-se rapidamente com outras forma-pensamento e o meu Ser
ficou preso na armadilha.
Reconheço
a capacidade de luta do meu ego em relação a mim. Ele não desiste
e eu deixo que sobreviva às minhas custas, e de que maneira...
O
que interessa verdadeiramente a este hospedeiro oportunista é
alimentar-se de uma identidade, seja qual for, desde que me incomode; da minha parte não entregando o que não
faz parte de mim e não aceitando o que tenho e sou, faz-me gerar mais resistências fechando o meu campo de visão. É como se vivesse com as portadas da casa fechadas à espera de ver o céu azul que sei existir do lado de fora.
Assim
está ele, o sr. Ego, todo enérgico, e eu cambaleante na minha peregrinação.
Acredito
que “depor armas” e entregarmo-nos a uma outra consciência de
nós mesmos, é o caminho para lá chegar, para pôr os pontos nos is
ao sr. Ego e convidá-lo a sair deste alojamento com direito a
reserva de admissão!
Meditar
é um estado poderoso de limpeza e de abertura. Sinto, aos poucos,
algumas mudanças (têm sido passinhos pequeninos), quanto às
resistências a que este ego me sujeita. Sinto que vão sendo
modificadas por uma energia diferente e que o vão enfraquecendo (sim, o objectivo é mesmo esse).
Gostava que fosse mais rápido (sim, que fosse totalmente desintegrado e me deixasse respirar sem medo) porque esta convivência não me tem
sido nada saudável, mas está a ser ao ritmo que consigo e isso é
muito mais que nada.
Hoje,
no jardim onde estava, dei ouvidos a um pensamento que se atravessou
e interferiu na beleza que observava: senti-me a pessoa mais triste
do mundo.
Arrepiei-me
apesar do calor e quando começou a crescer aquela emoção ligada à
tristeza (mais uma série de pensamentos prontinhos a serem disparados lá do covil-passado), apercebi-me do pequeno sinal que apontava na direcção
deste boicotador: lá estava o sr. Ego a intrometer-se na minha
alegria. Estaria a ficar com apetite de desgraças e achou que já era
demasiado tempo para eu estar ligada a outras coisas que não a ele.
Não
me fez chorar, não fiquei amarga, não me fechei no quarto.
Agradeci
por esta experiência que me permitiu ver o quanto ainda tenho para
realizar e sentir.
E
um alegre passarinho voou rasante no jardim, fez uns círculos perto
de mim e seguiu caminho. Foi uma aula prática sobre o que fazer
comigo.