sexta-feira, 23 de julho de 2010

Merkabah


 

A Esperança em torno de si mesma; aprendo e aguardo.
Eu em torno de mim mesma; defino e avanço.
Duas metades que se encaixam e se tornam zodíaco impresso colocado no centro da mesa.
Viajo em círculo sobre a cidade, em torno do planeta, gravo na minha pele feérica sobre crepúsculos a espiral incandescente  símbolo do infinito.
 
A esperança é uma estrela, a estrela faz um círculo, o círculo é o recomeço, outra esperança, a espera de um novo ensinamento, a esfera de um novo círculo, rotação do meu eixo, o caminho para a noite e para o dia, boca feita abóbada, olhos na roda da Merkabah.
 
Quebro padrões que se transformam em templos elucubrantes na rotação. Perfilo rosas denominadas pelo apreço dos tempos e raízes externas que observam os agressores de um certo silêncio. A Gratidão é a mais profunda maneira de receber a vida que se retoma - penso enquanto a realidade elemental circunda a aceleração do princípio.
 
O coração e o sorriso respiram no aroma da flor de laranjeira que se desprende desta magnífica cidade. Atento à batida das suas entranhas, testemunho centenários de história, e de novo o coração e o sorriso fazem sobressair as letras mais pequenas do sussurro em movimento.
 
Agora no interior do halo de luz dirijo-me para a estrela em rotação nas entranhas do mais profundo a que posso chegar e ascendo livre com todas as vozes de amor. Epicuro segue à minha frente, é recebido na pura certeza da trajectória serena da alma. Juntam-se caminhantes tocados pelo romantismo desta cidade e já predispostos a coisas ditas invulgares. Translúcidos e equidistantes assomam à entrada do portal de mãos abertas, símbolos perfeitos, desenhados no olhar de quem tudo sente. Aproximo-me radiante.
Parte da sombra improvável, mas real, é uma flor escondida a medo. Temos jardins e florestas na mesma frequência. Aprendemos com o medo a ter medo. Existem continentes submersos de medo. Somos o mais profundo dos abismos de medo. Rezamos com o corpo do medo. Prendemos a alma por fora e por dentro do medo. Não nos damos espaço em nome do medo. Não sabemos o que fazer com a nossa amplitude no medo. Rodeiam-nos pequenas satisfações que não nos completam à conta do medo.
 
A alma vai escrevendo cifras imortais, desenhando estrelas permanentes, que ousa não ter medo e com paciência vai adormecendo o temor que adulamos e nos faz fugir. É só um pequeno nada, nada mais. Pensamos que nos propõe uma difícil escalada. Por detrás do espelho descobrimos uma forma pequena e nua que se esforça por parecer grande. Quanto tempo é preciso para saber que o amor é imenso e possível? Solta-se uma frase que alguém disse: Se queres a verdadeira liberdade deves fazer-te servo da filosofia. Qualquer tipo de servidão?
 
Epicuro de novo, com o olhar de responso sobre o que perdeu, procura uma chama que se lhe extingue à nascença. Ou talvez não fosse bem isto que a sua tradução quis dizer. Há línguas difíceis e outras incapazes. O que compreendeu deixou de existir como a sua língua. O pássaro confundiu-se com a nuvem e esta com a sua realidade. Passeou em todas as paisagens, visitou todas as terras, não encontrou o sol das almas e despediu-se da terra sem o canto das cigarras. E uma lua muito serena desceu de um dos braços da Merkabah e deitou-se magoada sobre o sábio.
 
Tudo será como no princípio. A Esperança em si mesmo. Só o céu testemunhou o instante desta beleza e ficou sem precisar de um desejo extravagante para ser infinito. Os felizes agradecem e não têm medo. A liberdade é a ponte para a existência subtil que a poesia canta e a filosofia adorna.
 
O seu brilho salvou a menina e emergiu na direcção da anciã como um peixe voador. Ambas acenam das suas barbatanas aladas e partem assim como vieram. Sinto na pele um aroma de liberdade. Sou impregnada pelo movimento giratório que desprende todos os perfumes da terra e de mim. Eu sou terra com tudo o que ela é. Eu sou poesia com todos os ideais que a fazem. Eu sou a mais pura invenção do amor que cresce em todas as direcções. Eu estou por dentro do céu.

 
 
*ao som de Bora por Mich Gerber (Tales of the Wind, 2004)

3 comentários:

  1. Espelho do teu nivel superior de consciencia.Definitivamente existem Seres mais evoluidos que outros...
    (Muito bem escolhido o Gerber,Maria.)

    "Só há um caminho para a felicidade. Não nos preocuparmos com coisas que ultrapassam o poder da nossa vontade"

    'bora!! ;)

    ResponderEliminar
  2. Somos inspirados por algo maior que às vezes nos chega de forma mais inédita...

    ResponderEliminar
  3. As dimensões,são intemporais...

    ResponderEliminar

Dentro da nave