domingo, 28 de abril de 2013

Depressão

Quase a  fazer 22 anos entre o que fui e o que sou, muitas diferenças sobressaem a olho nu.
Contudo, a mesma sensação antiga está lá: a de quem se tentou adaptar a várias circunstâncias para não deixar a sagração da música.


  Maio de 91 em Coimbra - nos estúdios da TSF antes da emissão da manhã.

 A "pistar" um  LP nos dias felizes da rádio.

Poder viver com o que tinha de melhor e que sei ser arte em mim foi o que mais desejei. 
Mas não resultou. 
Muita coisa ficou pelo caminho, pessoas sobretudo, as que mais amei, as minhas escolhas nem sempre abençoadas, intransigências inevitáveis,  pagaram o preço altíssimo do nada acontecer.
 
Um dia disseram-me que tinha uma alma incompreensível, que a minha tristeza afogava qualquer possibilidade, que era a cantora mais magoada que conheciam, que o meu caminho era de pedras, mas que se me entregasse  sem receio a minha expressão seria genuína.
Eu sabia que era. 

Mas...




Falar de depressão publicamente é quase um suicídio social. 
Permitem-se benevolências a outro tipo de vícios - as drogas sobretudo, mais a quantidade de instituições e projectos de reabilitação - o álcool porque é de certo modo "cultural", mas para quem vive em depressão  há uma atitude de julgamento generalizada sobre a anormalidade do indivíduo, que é "maluco da cabeça" e passa a vida em psiquiatras.

Os amigos afastam-se pela falta de tempo e a impotência de não saberem lidar com a situação; a família enfada-se daquela pessoa que tem "tantos problemas", não compreendem o porquê de se ser "tão fraca"  e por vezes agem com violência psicológica fazendo-nos sentir mais culpados do que somos porque não reagimos como eles querem.

Ninguém quer chegar perto da linha que se parte com uma dor maior e que  pode chutar qualquer um para o lado que tanto evitam. Este.

Já me disseram que depressão é "coisa de satanás", "uma birra para chamar a atenção", "um capricho alimentado pelo  ego", "uma vingança contra os que amamos", "uma escolha sinistra de vida"...

Por ventura haverá alguém que entenda o que me não tem sido fácil transmitir, nem agora, apesar desta tentativa, sem me importar com os julgamentos que virão. Porque sei que virão.
de ti,
        de ti,
               de ti
                       e de ti...

A depressão não é uma doença contagiosa. Não é falta de vontade.
É uma dor que não se consegue adjectivar e que fica maior de cada vez que decide assombrar-nos.
 
Onde gosto de estar -  2012/2013

6 comentários:

  1. Obrigado! É a primeira vez q me deparo com um testemunho em q tanta coisa, tanto pormenor, encaixa em muito do q muitas vezes senti e pensei. Obrigado.

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  2. Pois sim. Também eu com 22 anos me ponho tão longe, tão mais forte, esperançado, amante e amado, que já nem sei. Com uma guita de 22 anos de comprimento, vou até um mundo com mãe, um mercedes amarelo com tecto de abrir, uma agenda telefónica de papel cheia de garantias, concertos ao vivo no Teatro Circo, ui! Lembra-me Um Sonho Lindo…
    Querida Né, deixe-me trata-la assim, não nos conhecemos mas não me é de forma nenhuma estranha, a sua voz de veludo brilhante está em todo o lado. Há milhares de pessoas amarradas às suas pobres vidas que a têm, a si Né, como uma luz e uma esperança.
    Reúna essas forças e levante-se, também para cantar, mas para todo o viver – já corre o “Porque Não me Vês” – não aceito menos que Todo Este Céu.
    Bj.

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  3. Olá Né Ladeiras! Ouvi na rádio M80 a sua música "sonho azul", e deu-me um ataque de saudosismo. Vim logo á net buscar informação, para saber o que é feito de si e dei com este blog. Sabe: Eu era uma criança na época e quando via esse teledisco, pensava:quando for grande, hei-de ter uma namorada assim(eh,eh,eh). Só queria partilhar consigo esta curiosidade, mas pedir-lhe que "se levante"; Se lhe serve de algum consolo, o mundo e o país estão cheios de pessoas deprimidas. Então saiba que há uma luz lá "em cima", que não nos "afasta" dos problemas, mas que nos ajuda a "atravessá-los". Saudações calorosas. João Silva.

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  4. Estimada Né, a sua voz, a sua música acompanhou a minha adolescência, a minha juventude e, sempre pensei, quando for grande quero ser assim. Hoje, já, quase, cinquentona, a sua voz e a sua música continua acompanhar-me. Esteve sempre presente nas, várias, fases da minha vida. De há uns anos para cá, também a acompanho, aqui no blogue. E, deixe-me dizer-lhe, na minha humilde opinião e, mesmo sem a conhecer pessoalmente, acho que a Né é muito mais que uma voz que se faz ouvir, que a musica que nos enche, é, também uma grande mulher, inteligente, defensora de causas nobres. Por isso, estimada Né, o caminho é para a frente, mais curva, menos curva, com subidas e descidas, é para continuar. Você é especial e nunca deixe que lhe tirem isso, nem mesmo você tem permissão para acabar com toda essa grandeza. Um forte Abraço. Fernanda Viana.

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