domingo, 28 de fevereiro de 2010

Primavera, Verão, Outono, Inverno... e Primavera



E a sala de projecções da nave apresenta o trailer da pérola (mais uma simmmmmmmmmmm) que XIIzinho sugeriu. Torrent aqui vamos!

Além da Linha Vermelha

Passou no Canal Hollywood por volta das 3 da manhã. Não foi entendido pela maior parte dos críticos americanos (porque será???) mas, para mim, demonstrou que nem todos os americanos são aquilo que normalmente penso...
The Thin Red Line (1998) de Terrence Malick, baseado na novela de James Jones (1964) sobre o desembarque da Companhia C na ilha de Guadalcanal. Várias estórias dentro da história.
Os horrores da guerra fazem os homens questionarem a razão do conflito. Entre a sanidade e a loucura existe uma ténue linha vermelha. Que guerra é esta no seio da natureza?
Uma obra prima.

sábado, 27 de fevereiro de 2010

Brit quê?

Assisti há pouco na RTP2 ao decadente Brit Awards. Babylon will fall (é o que penso). Inglezinhos arrogantes e orgulhosos do lixo que produzem, americanozinhos cheios de importância oca.

Mas a boa notícia é que se vão encontrando pérolas desta natureza que é arte sem truques baixos ;)


Emily Loizeau - l'autre bout du monde
Emilie Simon - Désert

PS- Bat For Lashes não ganhou. Era de esperar que as criaturas que votam na porcaria que vai de estatueta para casa sejam uma enorme vara de porcos a quem certas pérolas são lançadas... em vão.

Príncipes e cavalos brancos

 
 
O Diogo conheceu a Paula num daqueles famosos intervalos. O problema teve origem na recusa por parte da Comissão de Gestão da realização do Plenário Geral do Ensino Secundário no Ginásio do Liceu. Estava em causa um espaço sem capacidade para receber cerca de 15.000 alunos. Os maoístas fizeram braço de ferro e os panfletos incitavam a uma mobilização em massa contra a decisão. (…) Vêm-nos dizer que o problema é de "tacos", mas nós sabemos que o problema não é esse, e, sim o da mentalidade tacanha dessa casta de russos-brancos, do coronel do MEC, ao comandante do COPCON, passando pelas comissões de gestão-fantoche (…).

O edifício foi isolado pelas forças militares, mas não impediu a realização de uma RGA anunciada de sala em sala para o dia seguinte. Com 127 votos a favor, 13 contra e sem a contagem das abstenções (o número de alunos do José Falcão era na altura de 2.400) os maoístas exigiram a demissão da Comissão de Gestão e no seu lugar a CPE (Comissão Provisória de Eleições) assegurava o funcionamento do liceu. Não conseguindo o pretendido fizeram outra ocupação nocturna na Associação de Estudantes e houve nova intervenção das forças de segurança.

No dia seguinte mais um meeting no átrio do liceu às 11:30 onde decidiram tomar de assalto as instalações da direcção da Escola. Formaram-se logo dois grupos, claro. O deles a atacar, e o nosso a defender. Houve feridos de parte a parte e a PSP foi chamada a intervir. Nem os nossos amigos Galifões, anarco-sindicalistas e cinturões negros, que nos valiam quando o cerco apertava e o número ultrapassava em muito a nossa resistência, tinham conseguido controlar a situação.

A Paula fora empurrada para uma sala de onde vinha a sair o Diogo. Gritei-lhe que a levasse dali. Sozinhas ainda nos apanhavam com ele era provável que não.

Desde o dia em que fomos expulsas da aula ficou minha amiga e aos poucos foi soltando alguns dos fantasmas que a perseguiam. Um deles foi o episódio trágico em que se perdeu do pai no meio de uma multidão em fúria. Não conseguiu reagir e não se lembra como foi parar ao aeroporto. Também me foi mostrar onde morava. O IARN subsidiava a diária com 270$00 e a Cáritas dava-lhe roupa. Como se encontrava sem família aguardava pela decisão de uma bolsa para completar os estudos.

E como vieste parar a Coimbra? - perguntei-lhe

Por causa da universidade. Linda aquela torre. Já a tinha visto em postais. Sempre quis vir estudar para cá, não nestas circunstâncias, enfim…

Esta cidade sempre foi uma aldeia grande - murmurei entre dentes e de mau humor.

Deu uma gargalhada em cascata e os caracóis fugiram-lhe em todas as direcções.

Adorava ter o teu cabelo! O que mais me entristece no meu é esta lisura enjoativa - suspirei revoltada por não ter uma juba.

Acreditas no amor? – perguntou de repente - Naquele amor que muda a vida das pessoas para sempre?

Claro que sim! - entusiasmei-me. Ali estava alguém que não troçava de príncipes e cavalos brancos – eu espero por esse dia me acontecer! - projectei.

Não estou a falar de um amor e uma cabana que depois se desfaz como a dos 3 porquinhos - sublinhou sem margem para dúvidas.

Também não era isso que tinha em mente. Sabes, aquela ideia oriental das metades da laranja? Eu acho que cada pessoa tem uma - abri-me um bocadinho. Não costumava falar de assuntos que não cabiam no materialismo dialéctico.

Sim, acho que deve haver algo que se encaixa naturalmente, que torna as pessoas em uma– olhou para as linhas da mão – eu vou ter uma vida longa, vês?

Olhei fascinada. Depois olhei para a minha.

Parece que vou ter muito pouca saúde. Caramba! Só cortes e tracinhos - constatei assustada.

Nada disso! Essa é a linha sentimental! A da vida é longa longa longa - revelou com um ar entendido.

Fiquei neutra. Uma coisa anulava a outra.

Tudo depende do momento, AQUELE momento – retomou - Depois vêm as impressões digitais do delírio que nem sempre correspondem...

Pega na mão dela Diogo - pedi - Está a ficar branca. Acho que lançaram gás pimenta estes cretinos. Artilharam-se com mocas de Rio Maior e já abriram a cabeça ao João.

Meti o meu cabelo dentro da camisola e vi o Diogo arrastar a Paula em direcção ao ginásio.

No meio da confusão lembrei-me que com uma linha assim ninguém me viria salvar, mas como a da vida era longa safava-me de certeza.


*Música – Cometa Rossa, Area (Are(a)zione, 1975)

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Dia de David



Desvio dos teus ombros o lençol,
que é feito de ternura amarrotada,
da frescura que vem depois do sol,
quando depois do sol não vem mais nada...

Olho a roupa no chão: que tempestade!
Há restos de ternura pelo meio,
como vultos perdidos na cidade
onde uma tempestade sobreveio...

Começas a vestir-te, lentamente,
e é ternura também que vou vestindo,
para enfrentar lá fora aquela gente
que da nossa ternura anda sorrindo...

Mas ninguém sonha a pressa com que nós
a despimos assim que estamos sós!


 in "Obra Poética"

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Método de afinação original

Ladeada por Miguel Veras (na guitarra) e Paulo Marinho (gaita e flautas) em 1996.

A cena hilariante, passada nesta viagem, tem a ver com o método de afinação ou como a necessidade faz o engenho... Já um pouco atrasados para o concerto o meu querido Paulo Marinho decidiu adiantar trabalho e afinou a gaita-de-foles dentro do carro. O roncão ia fora da janela, caso contrário explodia-nos os tímpanos, o que originou muitas e muitas caras incrédulas que passavam por nós...
Adorei trabalhar com estes músicos e guardo as melhores lembranças do ambiente que vivemos.

Indo por la Sierra (ou o romance da lhoba parda)
 
 
Sobre os "meus" canis lupus signatus

No camarim, a hora - das - sandes - de - alface

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Porque prefiro os lobos

Fernando Nobre, porquê?

Estupefacta com a notícia da candidatura. As razões estão neste artigo Público de Vasco Pulido Valente. E para que se saiba, não voto num presidente-caçador, não voto num presidente-alheado. Em branco.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

On the Road


A integração da Paula foi lenta. Falava o indispensável, olhava acima do horizonte, desaparecia misteriosamente no fim das aulas. Era raro participar em alguma actividade dentro ou fora do liceu. Começou a despertar paixões e ódios. Os rapazes desejavam-na pela distância que impunha, as raparigas detestavam-na pelo balanço das ancas. Para umas era provocadora e demoníaca, para outros era a beleza indomável dos livros de Jorge Amado.

Costumava chegar cedo e isolava-se no relvado por baixo duma acácia. Com o tempo as olheiras deixaram de ser castanhas e os olhos verdes ficaram mais luminosos. Diziam que era filha de um militar e da uma lavadeira. Que ele tinha prometido "cabelo di loja" se ela fizesse mais do que lhe lavar as sarjas. Também se especulava sobre a sua origem Himba e toda a gente veio com informações enciclopédicas sobre a sociedade poligâmica liderada pelas mulheres do deserto. Houve quem a tentasse seguir, sem resultado, para saber mais detalhes. Chegava a meio do Jardim da Sereia e era como se transformasse em arvoredo. A época não era propícia a crenças, não quando se defendia o materialismo dialéctico, mas lá bem no íntimo todos achavam que existia algo de sobrenatural naquela criatura.

De novo, na aula da Dr.ª Bacelar, mas desta vez às voltas com a lei de Joule, murmurei à Paula que não era possível a vida ter de passar por aquilo. Ela sorriu com aqueles dentes perfeitos e murmurou:

Já pensaste quantos dariam por estar nesse lugar aí? Sim, no teu… Eu quero ser médica ou cientista, tu quererás ser outra coisa. Há milhares de raparigas que nunca lá irão chegar. Eu e tu podemos.

Com alguma razão, claro - reflecti - mas só isso não resume uma vida - concluí segundo a minha perspectiva

Há quem ache o estudo cansativo e duro, mas ir buscar água a 40 km é muito pior… na aldeia da minha avó angolana era assim que se fazia. 40 km para trazer 2 baldes… o trabalho é uma lei da humanidade e ainda bem que existe. O que faríamos com o tempo? - perguntou num jeito de resposta conhecida.

Mas Paula - atalhei - a própria vida é uma escola, a melhor que se pode ter. Viajar, reflectir, amar, on the road Paula, já leste esse livro? Diz-me como é que Kerouac podia ser o que foi se não tivesse vivido assim? Porque nos impõem as coisas? Porque não somos livres? Porque é que há tantas regras?

Tu vives dentro de uma coisa que não existe. Aliás existe, mas até sabermos o que fazer com ela vai demorar… Mostra-me esse Kerouac, essa estrada sem princípio e fim e eu mostro-te o que é morrer sozinha, o que se faz em nome da intolerância, da cor da pele. Somos 10 etnias e eu nem sou nada porque a minha mistura não se encaixou em nenhum lugar e obrigou-me a sair do meu país, mas sei da terra que precisa de mim, dos que se tornam em pó sem nada, dos que morrem ainda com menos, e do que é preciso fazer para mudar - expôs com um misto de revolta e de esperança.

Eu estava aturdida com as imagens expostas que nem me apercebi do silêncio que se fez à nossa volta e que metia medo.

SIM SENHOR. MUITO BEM. Aplausos para as filósofas da classe. Olhámos para a Dr.ª Bacelar que se debruçava em vénias irónicas à nossa frente. Risos nervosos dispararam em todas as direcções da sala de aula. A minha companheira de carteira olhou para a professora com um ar desencantado. Eu fiquei à espera do desenlace.

Se vocês se interessassem pela matéria como se interessam por essas reflexões existenciais teriam múltiplos 20! O caso é que isso para aqui não interessa nada, não tem a ver com a disciplina, não provém do que acabei de explicar. O que foi que eu expliquei? Não sabem? Eu calculava. Essas cabecinhas não podem estar em dois lados ao mesmo tempo - metralhou enquanto se dirigia à secretária. Pegou no livro de ponto.

Lá vem mais uma falta disciplinar - calculei e bem. Não era a primeira que tinha a infelicidade de mostrar ao meu pai.

"On the road", não? – riu baixinho a Paula.

Sim – respondi à ironia – pelo menos até ao Largo da Portagem…


 
*Música – Born to Run, Bruce Springsteen (Born to Run, 1975)

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Nº 26 do 6º A


 
A Paula tinha chegado com a última leva de retornados num voo apinhado e perigoso que deixou Luanda sob gritos tribais. Estava a descobrir a adolescência quando aterrou no liceu José Falcão. Cabelos encaracolados, olheiras castanhas, roupa que sobrava no corpo de gazela, chegou à sala de aula olhos postos no chão. Seguia a linha irregular dos tacos em paralelo com as assimetrias do seu trajecto como as que estavam desenhadas na madeira. Percebemos que não se sentia à vontade, que não desejava  ser olhada como um bicho raro. Ninguém lhe fez a vontade. As raparigas avaliaram-lhe o título de retornada, os rapazes imaginaram-lhe o corpo de gazela na praia sem roupas nenhumas.
 
Levantou a cabeça quando a professora de físico-química tossicou antes de a apresentar aos colegas. Olhou-nos desafiadora e pronta para a guerra se fosse caso disso.
 
Atenção turma, esta colega é nova, vai frequentar o 6º A e espero que todos sejam simpáticos com ela. Paula, eu sou a tua professora e directora de turma, Dr.ª Antónia Bacelar. Exijo bom comportamento e atenção nas aulas. Apesar do que acontece lá fora, que é totalmente convosco, aqui não permito discussões partidárias.
 
Claro, pensou grande parte da turma, és do tempo da outra senhora e nem sabemos porque não foste saneada…
 
Sou professora há 45 anos e neste liceu, que já foi D. João III, ensinei muitos jovens que até agora eram masculinos, mas com isto tudo passou a misto… e o que quero frisar é que lá por estarem misturados não permito faltas de respeito. Agora vai-te sentar. Ficas ao lado da colega nº 25.
 
Sentou-se na minha secretária de dois lugares. Sorri-lhe solidária por saber o que custa ser avaliada de forma impiedosa. Já tinha passado por algo semelhante quando a mesma professora me presenteou com uma falta disciplinar, seguida de uma expulsão do laboratório de química. Ironizou à frente de todos a minha desfaçatez de levar a viola a par com os livros.
 
Suspirei. Mais uma seca de aula com fórmulas que na prática borbulham em balões volumétricos e cheiram mal. Porque não nos manda ler Gente da Terceira Classe ou os Gaibéus? A nova colega cortou-me o início do devaneio quando me tocou na mão e perguntou baixo:
 
O que é um português de 2ª?
 
Respondi-lhe que no intervalo lhe explicava, que ali não era o sítio indicado porque fosse da velha guarda ou não aquela profe era uma diaba e eu não queria ir a exame.
 
Concentremo-nos na Lei de Lavoisier m(reagentes) = m(produtos). E se quiseres podes levar o meu caderno para casa, há mais disto para estudar… - aconselhei-a.
 
O toque do intervalo vibrou igual à tensão que crescia pelas salas e corredores do José Falcão.
 
Tanta coisa para viver e nós a falar de massas que se mantêm na mesma – comentei com a nova colega.
 
Veio o burburinho do costume depois da Drª. Bacelar sair da sala, não sem antes lançar o anúncio ameaçador de um teste dali a 3 dias.
 
Vi a Paula encaminhar-se para o átrio onde iria haver, por certo, mais um confronto entre MRPP’s e UEC’s. Os FEC-ML iriam juntar-se a outros maoístas e aos extremistas do costume e nós, os sociais- fascistas, levaríamos a triplicar… Mas as verdadeiras massas necessitam de mudança, de reformas, de nacionalizações e para isso é preciso esclarecer os indecisos do átrio… mas… onde se meteu a miúda? Queria falar-lhe destes assuntos do nosso liceu porque era possível que fosse apanhada no meio da ocorrência e levar dos dois lados, mais a mais sendo retornada...
 
Como lhe iria explicar que um português de 2ª é não importa quem desde que tenha vindo de África? Que é obrigatório serem todos reaccionários e exploradores de pretos e que mesmo as miúdas mulatas com corpo de gazela não vão ficar isentas desse crime?

Lágrima de Preta, Adriano Correia de Oliveira (Gente de Aqui e de Agora, 1971)

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Às voltas

No baú das viagens descobri um walkman Sony (passo a publicidade) que me deu muita música enquanto atravessava a Europa nos idos anos 80. Da malinha vermelha das cassetes, cheias de pó e irremediávelmente perdidas, destacou-se Searching for the Young Soul Rebels,dos meus adorados Dexys Midnight Runners. Muito mais espontâneo do que qualquer Eileen (nunca gostei dessa canção, nem do conceito sonoro do album Too-Rye-Ay, meio campesino/deslocado) aqui fica There there my dear.

Sorte sorte foi vê-los na Festa do Avante, em 1981, no Alto da Ajuda!

Lado A

Burn It Down

Tell Me When My Light Turns Green

The Teams That Meet in Caffs

I'm Just Looking

Geno


Lado B

Seven Days Too Long

Couldn't Help It If I Tried

Thankfully Not Living in Yorkshire It Doesn't Apply

Keep It

Love Part One

There, There, My Dear

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Istmo de Ehsan



A esperança é circular, viaja pelo globo à volta dos átomos de futuro, daqueles outros que adormecem fatigados e retomam a caminhada pela estrada da luz. Gira à volta dos esquecidos, das celas escuras, das palavras que nascem da boca dos acusados. A esperança é dervish. Dança ininterruptamente na rotação da morte e da vida, do desperdício de quem não crê, de quem desiste, mas ainda não. Reparte as vozes isoladas numa circunferência zodiacal, desenha em cada mapa trígonos e vocações, articula o raciocínio dos justos, liberta o sangue dos mártires.

Não tenho medo da morte. Mesmo agora, que sinto a sua presença estranha e honesta junto de mim, continuo a querer cheirar o seu aroma e redescobri-la. A morte tem sido a companhia mais antiga desta terra. Não quero falar da morte; quero questionar as razões que estão por trás dela. Hoje, quando o castigo é a resposta para aqueles que procuram a verdade e justiça, quem pode temer o seu destino?...

A esperança é heróica. Auxilia-se a si mesma, transporta a fraqueza nos ombros, perdoa a inanidade de qualquer amparo, atinge o sublime quando privada de qualquer auxílio. A esperança é a capella. Penetra nos espaços, propaga harmónicos entrelaçados, reúne milhares de vozes e amplifica a construção urgente da Paz. Decidida. Não se senta com a incerteza, não come com a dúvida, conhece o sobrenatural das noites luminosas, desafia a desolação anónima e ergue os decaídos à sua passagem. Irradia no deserto humano o músculo de ferro. É vela solitária na ascensão. É o istmo de Ehsan, a montanha de Toloui, o planalto de Shivan. A esperança é o som de tombak das mães despojadas, dos pais orfãos, dos filhos do acaso,  acorda peixes e multiplica pássaros. É o grande tear do povo sem rebanhos, a raíz da rubia que tinge as vestes dos sete anjos protectores. Infunde a razão no epicentro do perigo e do sofrimento e com ela se eleva. Persiste como a árvore transplantada, as suas raízes alimentadas por outras raízes vivas, que vão escavando até encontrar alimento. Esperança é a árvore de Behistun, que se ergue com os ramos de novas folhas, virados para o sol, luz translúcida, faísca que não se extingue na miséria detiorada, é a escrita cuneiforme do sonho esmagado de Dario, é o que transcende o limite, o que resiste à maldição. Esperança é o teu nome. O dia que vem, depois do último dia.

Se os governantes e opressores pensam que com a minha morte a questão Curda irá desaparecer, estão enganados. A minha morte e a morte de centenas de outros como eu não curará a dor. Irão acrescentar mais chamas a este fogo. Não se duvide que cada morte é o inicio de uma nova vida.(Ehsan Fattahian)

*
Música – Kayhan Kalhor and The Brooklyn Rider, Ascending Bird (Silent City 2008)

Roya Toloui – activista e chefe do jornal Rasan (Despertar) torturada em 2005, durante 66 dias, na prisão de Sanandaj por ser considerada uma ameaça à segurança nacional.
Shivan Qaderi – activista dos direitos curdos morto a tiro em 2005, pelas forças de segurança iranianas e atado a um jeep que o arrastou pelas ruas de Mahabad, como intimidação a futuros protestos.
Ehsan Fattahian – activista curdo torturado durante 3 meses e executado por enforcamento, no dia 11 de Novembro de 2009, a mando do governo iraniano.Acusado de participar em actividades contra o regime. Tinha 27 anos.
Behistun – monte situado na província de Kermanshah a 500 km oeste de Teerão.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Dia de Melanie



A primeira vez que ouvi Melanie Safka foi em 1970 a cantar esta canção. Tornou-se uma das maiores referências do flower power que ainda reside em mim. :)

Lay Down (Candles In The Rain)

Lay down, lay down, lay it all down
Let your white birds smile up
At the ones who stand and frown
Lay down, lay down, lay it all down
Let your white birds smile up
At the ones who stand and frown.

We were so close, there was no room
We bled inside each other's wounds
We all had caught the same disease
And we all sang the songs of peace.

Lay down, lay down, lay it all down
Let your white birds smile up
At the ones who stand and frown
Lay down, lay down, lay it all down
Let your white birds smile up
At the ones who stand and frown.

So raise the candles high
'Cause if you don't we could stay black against the night
Oh raise them higher again
And if you do we could stay dry against the rain.

Lay down, lay down, lay it all down
Let your white birds smile up
At the ones who stand and frown
Lay down, lay down, lay it all down
Let your white birds smile up
At the ones who stand and frown.

We were so close, there was no room
We bled inside each other's wounds
We all had caught the same disease
And we all sang the songs of peace
Some came to sing, some came to pray
Some came to keep, the dark away

So raise the candles high
'Cause if you don't we could stay black against the sky, oh
Oh, raise them higher again
And if you do we could stay dry against the rain.

Lay down, lay down, lay it all down
Let your white birds smile up
At the ones who stand and frown, you gotta
Lay down, lay down, lay it all down
Let your white birds smile up
At the ones who stand and frown, you gotta
Lay down, lay down, lay it all down
Let your white birds smile up
At the ones who stand and frown
Oh Lay down, lay down, lay it all down,
Let your white birds smile up
At the ones who stand and frown
Lay down, lay down, lay it all down
Let your white birds smile up
At the ones who stand and frown.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

O início


Esta actuação deu-se na fábrica Mondorel (1975) quando a "Cantiga era uma Arma" e em palco estão:
Jorge Santos, Zé (infelizmente não me recordo do apelido e nas minhas notas não foi escrito) , eu, Jorge Gouveia Monteiro, Rosa Lameiras, Zé Maria Almeida. Não sei o nome do rapaz das congas. Creio que foi um espontâneo (porque os havia em muitas situações)


Estamos na Guarda, em plena campanha eleitoral para as legislativas de 1976.
Aqui temos o Seabrinha a tocar flauta, o Jorge que se repartia entre a viola e as congas, eu com uma cadelinha adoptada ao colo (trazida de Vale de Zebro, Ponte de Sôr) e o extraordinário Zé Maria que além de voz sabia tocar TUDO!!!
Assim foram os primeiros tempos da Brigada Victor Jara.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

COM A TUA LETRA



Porque eu amo-te, quer dizer, eu estou atento
às coisas regulares e irregulares do mundo.
Ou também: eu envio o amor
sob a forma de muitos olhos e ouvidos
a explorar, a conhecer o mundo.

Porque eu amo-te, isto é, eu dou cabo
da escuridão do mundo.
Porque tudo se escreve com a tua letra.

in A Musa Irregular,1991